quarta-feira, 13 de julho de 2016

FAB 2900: o primeiro Boeing 767 da Força Aérea Brasileira

Em 10 de outubro de 2013, a Força Aérea Brasileira finalmente aposentou, depois de 26 anos de serviço, os Boeing KC-137, aeronaves 707 civis, usadas, convertidas para aeronave de reabastecimento no ar e transporte. O custo de manter aeronaves tão antigas (45 anos) em serviço era alto demais, a confiabilidade deixava muito a desejar, e um acidente, sem vítimas, com o FAB 2404, no Haiti, em maio de 2013, acabou precipitando a retirada de serviço da aeronave. Os KC-137 nunca mais voaram, a partir de então.
O C767 FAB 2900 em San Bernardino, Califórnia, em 27 de junho de 2016, pouco antes do primeiro voo de teste após sua reconfiguração militar
O problema é que os KC-137 foram aposentados antes que um substituto tivesse entrado em serviço.
O acidente do FAB 2404 no Haiti precipitou a retirada de serviço dos KC-137 da FAB
A FAB iniciou em 2008 o Programa KC-X2, para aquisição de aeronaves de carga e reabastecedor,  mas a retirada de serviço antecipada dos KC-137 deixou a FAB sem uma aeronave de transporte de grande capacidade e longo alcance, necessária em vista das ações da Força Aérea de cumprir missões de paz da ONU, e de ajuda humanitária, além de transporte diplomático de longo alcance. Essas missões foram sendo atendidas, precariamente, por aeronaves Lockheed KC-130 ou C-130, ou por fretamento de aeronaves comerciais. Nenhuma das soluções era boa, devido à baixa capacidade e velocidade dos Lockheed, e pelo alto custo tanto dos fretamentos quanto do uso dos C-130.
Concepção do futuro KC-767 da FAB
Em 14 de março de 2013, a FAB anunciou, oficialmente, a empresa israelense IAI como vencedora da licitação, para conversão de três aeronaves Boeing 767-300ER para KC-767, transporte estratégico de longo alcance e reabastecedor no ar.

As ações do Programa KC-X2, no entanto, acabaram retardadas por sucessivos contingenciamentos financeiros por parte do Governo Federal, e a entrega desses aviões convertidos ainda está, infelizmente, num impasse e longe de se concretizar.

Como a necessidade de um avião de grande capacidade e longo alcance é premente, a FAB lançou uma licitação internacional urgente, visando o arrendamento de uma aeronave Boeing 767-300ER civil. O pagamento desse arrendamento seria feito mensalmente por horas voadas, a aeronave deveria estar em serviço comercial normal e não deveria ter mais que 25 anos de fabricação. O prazo do arrendamento seria de três anos, prorrogáveis por mais um ano, e após isso a aeronave deverá retornar ao serviço comercial civil.
O Boeing 767-31A, PH-MCM, quando foi entregue ao seu operador original, a Martinair
O contrato foi assinado em junho de 2016, com a empresa Colt Transportes Aéreos. A aeronave escolhida foi o Boeing 767-31AER, c/n 26470, o 416º Boeing 767 produzido, cujo primeiro voo ocorreu em 4 de fevereiro de 1992. Esse avião foi entregue ao seu operador original, a Martinair Holland, da Holanda, em 25 de fevereiro de 1992, e registrado como PH-MCM. Em 14 de dezembro de 2013, foi para a SkyGreece, da Grécia, e registrado como SX-BPN, tendo voado por um curto tempo na Air Madagascar em regime de wet leasing, com a mesma matrícula. A SkyGreece encerrou suas atividades em 27 de agosto de 2015, e o avião ficou parado até ser enviado a San Bernardino, Califórnia, em junho de 2016, com registro provisoriamente reservado, N328MP, em nome do Bank Of Utah Trustee, nunca aplicado e já cancelado no FAA.
O C767 da FAB em sua última configuração civil, operando pela SkyGreece
O avião, originalmente equipado com 106 poltronas Economy Premium e 164 poltronas Economy, configurado apenas para transporte de passageiros, foi repintado em San Bernardino pela empresa Pulsar, subcontratada pela Colt, em cor cinza de baixa visibilidade, o padrão então em vigor no Esquadrão Corsário, 2º/2º Grupo de Transporte, baseado na BAGL - Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Sua configuração na FAB permite o transporte de 257 passageiros, mas, por enquanto, sua configuração interna ainda é desconhecida. Por fotos, fica evidente que suas poltronas Economy estão em configuração 2-3-2, sete fileiras, e revestimento em couro azul acinzentado. Os motores são Pratt & Whitney PW 4060.
Trabalhos de pintura do FAB 2900 em San Bernardino
A FAB contratou a ABSA - TAM Cargo em 2013 para treinar as tripulações desse avião. O treinamento iniciou-se em dezembro de 2013 e encerrou-se em fevereiro de 2015. Dez oficiais aviadores fizeram o curso, que incluiu 150 horas de voo cada um, e três oficiais obtiveram qualificação de instrutor no Boeing 767.
Pintura do C767 da FAB em cinza de baixa visibilidade, padrão do Esquadrão Corsário
O Boeing foi carregado na FAB como FAB 2900, iniciando uma nova série de registros de carga (termo utilizado para o registro de aeronaves na FAB). O avião não tem porta de carga, mas pode transportar 115 metros cúbicos de carga nos dois porões, 15 metros cúbicos a mais que a capacidade completa do KC-137.
Pintura da aeronave, em San Bernardino
Após alguns voos de teste, a partir do dia 27 de junho de 2016, e correção de pequenos problemas, o avião viajou ao Brasil, com cinco oficiais aviadores a bordo, e pousou no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, às 08h 25min do domingo, dia 10 de julho de 2016. Aguarda os procedimentos de treinamento, adaptação e burocráticos para fazer sua primeira missão. Dois caças F5 baseados em Santa Cruz escoltaram o voo de entrega do primeiro C767 da FAB.
Cerimônia de recebimento da aeronave, em 10 de julho de 2016
Após quase três anos sem voar, o 2º/2º GT volta a operar, pelo menos em capacidade de transporte, já que o FAB 2900 não tem equipamento de reabastecimento em voo, condição que deverá ser coberta após a retomada do Programa KC-X2 e a chegada dos previstos dois ou três Boeing 767 convertidos pela IAI. A princípio, essa conversão deverá ser feita no Brasil, em Porto Alegre, nas instalações da TAP ME. Quando esses aviões chegarem, o FAB 2900, que pode ser considerado como aeronave provisória, será devolvido.
Interior do C767, quando foi recebido
A configuração definitiva dos dois ou três Boeing KC-767 da FAB vai permitir capacidade de reabastecer aeronaves em voo (REVO), levar 240 passageiros, 81 macas de evacuação aeromédica ou dez UTI completas, e carregar até 43 toneladas de carga.
Imagens da cerimônia de recebimento do avião, 10 de julho de 2016

domingo, 10 de julho de 2016

"Oooops, pousei no aeroporto errado!!!"

Pousar no aeroporto errado é dos erros mais bizarros que acontecem na aviação, mas está longe de ser um erro incomum, mesmo com o uso de modernos equipamentos de navegação e o uso de modernos sistemas de monitoração de aeronaves pelo controle de tráfego aéreo. Então, apesar do Radar, do GPS, do ADSB e do RNAV, erros acontecem...
O N780BA, que pousou no aeroporto errado em 2013
A FAA - Federal Aviation  Administration fez um estudo a respeito e concluiu que, entre 1990 e a atualidade, ocorreram cerca de 150 casos, sendo que, pelo menos, 35 voos chegaram a pousar em aeroportos aos quais não eram destinados. Com certeza, muitos casos sequer foram reportados

Quando se trata desse assunto, o caso clássico mais lembrado é, sem dúvida, o do piloto Douglas Corrigan, que fez, em julho de 1938, um plano de voo de Nova York para a Califórnia, mas acabou pousando na Irlanda, cerca de 27 horas depois... 
Um curioso fotografa o N780BA em Colonel James Jabara Airport
Os casos que envolvem aeronaves comerciais, de carga ou de passageiros, se repetem mais do que as empresas aéreas gostariam de admitir.

Um dos casos mais recentes e notórios, nos Estados Unidos, ocorreu com um Boeing 747-400LCF "Dreamlifter", o N780BA. O Dreamlifter é um dos quatro Boeing 747 modificados para carregar componentes pré-fabricados dos Boeing 787, e o avião em questão era operado pela Atlas Air para atender à Boeing.
Curiosos observam o Dreamlifter no aeroporto errado
No dia  20 de novembro de 2013, o N780BA deveria pousar na Base Aérea de McConnell, para embarcar componentes de Boeing 787 na Spirit AeroSystems, vizinha a essa base, para depois levá-las à fábrica, em Everett, Washington. Seria um pouso noturno, a pouco mais de 21 horas, horário local.

O voo transcorria normalmente, mas o Dreamlifter não chegou à Base de McConnell, e pousou na pista do pequeno aeroporto regional de Colonel James Jabara Airport, em Wichita, Kansas, situada 9 milhas antes da base aérea.

O Colonel James Jabara Airport é um pequeno aeroporto regional. Sua pista de concreto, orientada 18-36, tem 1860 metros de comprimento por 30 metros de largura, e opera apenas aviação geral. Os operadores do aeroporto estranharam o pouso do avião, julgando que fosse alguma emergência.
Uma ave perdida, num aeroporto estranho

Pelo rádio, o comandante logo ficou ciente que tinha pousado no aeroporto errado, declarando isso pela fonia. As pistas de McConnell e de Colonel James Jabara estão orientadas praticamente na mesma direção, e embora o comandante do N780BA estivesse fazendo um procedimento de aproximação por RNAV para McConnell, avistou as luzes da pista de Colonel James Jabara e fez um pouso visual, mas no aeroporto errado.

O incidente não teve maiores consequências. O 747 vazio não chegou a danificar a pista. A Boeing enviou um trator de push back para manobrar a aeronave nos estreitos limites da pista, e no início da tarde do dia seguinte, o Dreamlifter decolou sem maiores problemas e foi para o seu destino original. A sorte é que a aeronave estava sem carga, que seria embarcada em McConnell.

Obviamente, o incidente foi seguido de uma investigação, que causou algumas preocupações para os tripulantes do avião.

Pouco tempo depois desse incidente, um Boeing 737-700 da Southwest também pousou num aeroporto errado. Esse incidente correu no dia 12 de janeiro de 2014, apenas dois meses depois do incidente do Dreamlifter.

O voo Southwest 4013, com 124 passageiros e 5 tripualntes, vinha de Chicago-Midway, devia escalar em Branson, Missouri, e tinha como destino final Dallas Love Fiel, em Dallas, Texas.
O incidente do 737 da Southwest nos noticiários da TV
O comandante fez a aproximação RNAV para Branson, mas acabou pousando no pequeno aeroporto de M. Graham Clark Downtown Airport. O constrangido comandante admitiu, logo após pousar, que estava no aeroporto errado. Os confusos e perplexos passageiros foram conduzidos ao seu aeroporto de destino de ônibus.

No dia seguinte, o 737, vazio, decolou da curta pista do aeroporto, de apenas 1.139 metros de extensão, e foi para Dallas.
O Boeing 737 da Southwest, pousado no aeroporto errado
No Brasil, a situação não é muito diferente. Alguns voos já terminaram no aeroporto errado, e vários, pelo menos, fizeram uma aproximação para um aeroporto para o qual não eram destinados ou esperados.

Na manhã do dia 9 de julho de 1998, o Fokker 100 PT-MRG, da TAM, com 108 passageiros, 6 tripulantes e um checador do DAC, a bordo, saiu de São Paulo-Congonhas com destino a Vitória, no Espírito Santo. O avião se aproximou do aeroporto, pousou sem maiores problemas, mas a comissária de voo Nelli Cristina, quando abriu a porta, se viu num lugar estranho, em frente a alguns funcionários perplexos. Ela pediu o serviço de apoio da TAM, mas foi informada de que isso não existia lá.
Fokker 100 PT-MRG da TAM, que pousou no aeroporto errado, em Guarapari/ES
O confuso comandante Tozzi, logo cercado pelos passageiros, se limitou a informar que fez um procedimento de aproximação visual para o aeroporto, e quando viu que pousava no aeroporto errado, já era tarde demais. Eles não estavam em Vitória, e sim, no Aeroporto de Guarapari, cidade balneária próxima.

Com apenas 1.190 metros de comprimento, por 30 metros de largura, a pista de Guarapari permitia nova decolagem, mas com algum alívio de peso no avião. O comandante Tozzi, portanto, pediu alguns táxis para levar alguns passageiros por terra, e suas bagagens, para aliviar o peso, para decolar com mais segurança.
O PT-MRG em Guarapari
Compreensivelmente, os táxis foram arduamente disputados pelos passageiros, assustados com a situação, e que nem a força iriam decolar naquele avião de novo, para um voo que não duraria mais de 15 minutos. De fato, 45 passageiros foram por terra para Vitória, abandonando o voo.

O Fokker 100 conseguiu decolar em segurança e pousou normalmente em Vitória, pouco depois, mas a TAM teve problemas ao enfrentar os parentes dos passageiros do voo, assombrados com o atraso sem explicações e com a perspectiva de que um acidente poderia ter acontecido com o avião. Houve muita desinformação e mal entendidos.

Para o azarado comandante, aquele seria um voo de recheque, e ele errou de aeroporto. Sem dúvida, não foi um bom dia na sua vida.

A TAM deu poucas explicações, declarando que havia problemas na indicação do DME, e à necessidade de voos visuais eventuais para manter a proficiência da tripulação, mas aguardou que o caso caísse lentamente no esquecimento.
Mais recentemente, um avião Embraer 190 da Azul, cumprindo o voo 9136, em 30 de outubro de 2011, entre Fortaleza, Ceará, e Teresina, Piauí, acabou pousando no aeroporto errado, no aeroporto particular Domingo Rego, em Timon, no vizinho Estado do Maranhão. O comandante percebeu logo seu erro, e alinhou o avião na pista, decolando em seguida. A permanência no solo foi de apenas três minutos, e logo o voo chegou ao seu destino. Os dois aeroportos estão distantes apenas seis quilômetros um do outro, e separados pelo Rio Parnaíba, divisa entre os dois Estados. As duas pistas têm orientação semelhante. A Azul se limitou a informar que o pouco no aeroporto errado foi devido a falhas operacionais, o que, no jargão da aviação, equivale a dizer: "Desculpem aí, foi mal..."