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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Soluções engenhosas para problemas espinhosos

Desde a invenção do avião por Santos Dumont, em 1906, os fabricantes de aeronaves tem se deparado com problemas a resolver cada vez que criam um modelo novo ou quando são desafiados a projetar e fabricar aviões para determinados problemas específicos.

A capacidade criativa do homem parece inesgotável, e é muito difícil ocorrer um problema para o qual não se encontre uma solução. Alguns exemplos de soluções engenhosas, para alguns problemas espinhosos, na aviação, podem ser encontrados na lista abaixo:

Pneus de tundra: um dos maiores desafios enfrentados pelos pilotos que precisam operar me regiões muito frias é a grande instabilidade do terreno, durante o verão, quando a neve derrete. Nas altas latitudes, o solo nunca descongela por completo, sempre restando uma camada congelada abaixo, denominada permafrost. O maior problema é que o permafrost impede a infiltração da água que ficou acima, tornando o solo pantanoso e macio demais para a operação de aeronaves ou para a construção de pistas pavimentadas, a não ser a um custo muito muito alto.
Pneus de Tundra em um Piper Super Cub
A vegetação que cresce nesses terrenos, constituída basicamente por liquens, é a tundra, que pelas suas características, torna o terreno mais macio ainda.
A tundra e sua vegetação característica
A solução para a operação de aeronaves nesses terrenos é utilizar os pneus de tundra. Esses pneus tem construção semelhante à dos pneus comuns, mas possuem diâmetro e largura muito maiores, e utilizam pressões muito baixas para o seu enchimento. Como o peso do avião se distribui em uma área muito maior do solo que os pneus comuns, eles não afundam no terreno, ainda que esse seja muito macio.

Uma aeronave Sherpa com pneus de tundra
Como são de pressão muito baixa, os pneus absorvem melhor os choques, possibilitando pousos em terrenos pedregosos e muito irregulares sem forçar a estrutura da aeronave.

A FAA - Federal Aviation Administration, dos Estados Unidos, limita o tamanho dos pneus de tundra a 35 polegadas, ou 89 cm de diâmetro. O maior arrasto durante a decolagem é compensado de modo muito simples: diminuindo a corrida de decolagem utilizando mais potência do motor. Essa maior potência também permite que o avião faça a aproximação com ângulos de ataque enormes, em baixa velocidade, com o uso do motor, reduzindo também a corrida de pouso.

Embora sua invenção possa ser creditada a muitos inventores, em vários países, na América do Norte é atribuída ao canadense Welland Phipps.

APU - Auxiliary Power Unit: Quando os primeiros jatos comerciais entraram em operação, um dos problemas mais críticos enfrentados pelos seus operadores era a necessidade de grande apoio de solo, não apenas nos aeroportos normais de operação, mas também nos aeroportos que pudessem servir de alternativa, em caso de dificuldades.
APU de um Boeing 777 (foto: Blog Aviões e Música)
Normalmente, no solo, um jato comercial tem necessidade de energia elétrica e por ar comprimido em baixa pressão, utilizado não somente para ventilar e condicionar o ar da cabine, mas também para dar a partida nos motores da aeronave. Motores a reação do tipo turbofan precisam girar a velocidades relativamente altas até alcançar uma rotação que permita sua autosustentação, e motores a ar comprimido são utilizados quase universalmente para esse fim.

Os primitivos Boeing 707 e Douglas DC-8, utilizados então em longos voos internacionais em rotas de grande demanda de passageiros e operando em grande aeroportos internacionais, podiam contar com grande apoio de solo, mas quando a Boeing resolveu criar, em 1963, seu primeiro jato verdadeiramente doméstico, o Boeing 727, precisou repensar esse conceito, para aumentar o número de aeródromos onde o avião pudesse ser operado.
APU e seus componentes (foto: Adriano Scarpa)
Na verdade, a solução foi tirada da experiência da empresa com os grandes aerobotes comerciais dos anos 30. Esses aviões tinham um motor auxiliar, de ciclo dois tempos, que acionava um gerador elétrico de corrente alternada, necessário quando os motores do avião estivessem parados.

No Boeing 727 que, por conceito, deveria operar com o menor apoio de solo possível, foi instalado um motor do tipo turboeixo, que acionava um gerador elétrico de corrente alternada. Esse motor também fornecia, através de uma válvula de sangria (bleed valve), ar comprimido suficiente para dar a partida nos motores e para manter o avião ventilado e com temperatura agradável no solo.
APU do Boeing 727, instalada próxima aos trens de pouso principais
A ideia foi copiada por todos os outros fabricantes. No Boeing 727, esse motor auxiliar, hoje mais conhecido por sua designação em inglês Auxiliary Power Unit, ou simplesmente APU, foi instalado na barriga do avião, devido à sua configuração de três motores na cauda, mas na maioria dos outros aviões, a APU está instalada no cone de cauda, onde pode ser notada pelo seu cano de escapamento e pelo ruido intenso que produz.

Golden Canopy: Os canopies, "bolhas" plásticas que protegem o cockpit de vários tipos de aeronaves militares, são peças mais sofisticadas do que parecem.
Canopy do Lockheed-Martin F-16
Como consistem praticamente na única proteção do piloto, devem protegê-lo de todos os perigos existentes no voo normal, como baixas temperaturas, radiações perigosas e relâmpagos.

Os materiais normalmente usados na construção de canopies são o acrílico ou o policarbonato. Um dos problemas desses materiais é que eles não conduzem energia elétrica, o que aumenta o risco do piloto sofrer, por exemplo a descarga de um raio dentro ou próximo de uma nuvem cumulus-nimbus.
Canopy do F-22 Raptor
Outro perigo que os pilotos podem sofrer, especialmente em grande altitude, são as radiações solares ou cósmicas, como ultra-violeta, raios-x e raios gama.Quanto maior a altitude do voo, maior é a incidência de radiações não filtradas e absorvidas pela atmosfera.

A solução encontrada para esses problemas foi aplicar uma camada de ouro metálico, finíssima, sobre o canopy. O ouro é um metal muito denso, e tão dúctil que, de apenas um grama, pode ser feita uma lâmina quadrada de 70 cm de lado e com apenas um milésimo de milímetro de espessura, seis vezes mais fina que um fio de cabelo e praticamente transparente.

O ouro, devido à sua densidade, filtra as radiações em grande altitude, e fornece o efeito de "Gaiola de Faraday" para o canopy, tornando-o condutivo, protegendo o piloto de eventuais descargas elétricas na atmosfera.



2 comentários:

  1. Muito bom ver o blog retornando à ativa, parabéns!

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  2. Professor Jonas, Parabéns pela volta à atividade do blog! Todos nós interessados em aeronáutica, mas não necessariamente profissionais do ramo, agradecemos.

    Um comentário sobre essa matéria professor: O sistema de deposição dessa película de ouro sobre a superfície plástica dos canopies provavelmente tem a ver com a técnica de deposição de metais à vácuo sobre superfícies plásticas usadas em embalagens flexíveis. Esse sistema utiliza câmaras de vácuo onde o metal é aquecido por indução e passa diretamente do estado sólido para o gasoso, formando uma espécie de "vapor" que se deposita sobre as superfícies plásticas com surpreendente aderência. Se for isso, é análogo ao processo utilizado em embalagens plásticas flexíveis - minha área de expertise - em envoltórios como os de pó-de-café ou os de biscoitos.
    Espero não estar muito errado. Abraço de um fã de seu blog.

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