quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Tormentos dos passageiros de avião no Brasil

Durante a última década, os brasileiros, animados pelas passagens mais baratas e pelo aumento da renda, passaram a viajar mais de avião, até então privilégio exclusivo de pessoas mais abastadas.
Entretanto, viajar de avião no Brasil não significa exatamente estar no paraíso. Aliás, está muito longe disso.

Para começar, o passageiro que sempre viajou de ônibus está acostumado com coisas simples, como saber exatamente o valor da passagem, como chegar na estação rodoviária e saber que sua poltrona está garantida, e que o ônibus quase sempre parte no horário correto.

O passageiro também sabe que, mesmo que tenha comprado sua passagem pela Internet, sua única tarefa é chegar na rodoviária antes do ônibus partir, e só. Sua viagem está praticamente garantida.
Já o passageiro de avião enfrenta um verdadeiro calvário. Para começar, o valor da passagem varia absurdamente, e as regras para isso não são nada claras. Embora alguns possam conseguir passagens ditas "promocionais" por uma ninharia, a maioria paga muito mais caro do que os anúncios e os noticiários apregoam.

O fato de ter uma passagem na mão, já paga, não garante em absoluto que a viagem vai acontecer. Para começar, na aviação, vigora um absurdo e ilógico sistema de "reservas". Então, um executivo que tem nas mãos várias passagens, de várias empresas, com data em aberto (valem por um ano), faz reservas em todos os voos para o seu destino e, obviamente, embarcará em apenas um desses voos. Claro que o tal executivo não se preocupará em cancelar as demais reservas, e quem arca com o prejuízo das poltronas não ocupadas são as companhias aéreas.

As companhias aéreas, claro, adotam um mecanismo de defesa contra essa prática: aceitam mais reservas do que lugares realmente existentes no avião, pois têm estudos estatísticos que, teoricamente, garantem que muitas reservas não serão honradas (o chamado "no show") e que todos os passageiros que se apresentarem terão lugar no voo.

As estatísticas nem sempre funcionam. De fato, em muitos casos o número de passageiros que se apresentam ao check-in é maior do que o número de pessoas que cabem no avião. É o famigerado "overbooking". O overbooking é ilegal e severamente punido pelas autoridades aeronáuticas, e o passageiro tem muitos direitos nesse caso, proporcionados tanto pelo Código Brasileiro de Aeronáutica quanto pelo Código de Defesa do Consumidor.

Mesmo assim, ou o passageiro não viaja ou viaja muito atrasado, o que pode significar, por exemplo, perder a chance de conseguir um bom emprego, de prestar um concurso público ou ver pela última vez um ente querido. As empresas, na verdade, preferem arcar com eventuais multas ou ações judiciais, pois o custo disso é menor do que arcar com muitas poltronas reservadas e não ocupadas.

O passageiro novato de avião espanta-se com a necessidade de comparecer ao aeroporto uma ou duas horas antes do horário previsto. Terá que se se submeter ao famigerado "check-in", coisa absolutamente desconhecida dos passageiros de ônibus. E tudo pode acontecer no check-in: filas quilométricas, passageiros com excesso de bagagem que não querem pagar taxas extras, travando as filas, e "celebridades" e políticos "furando" fila...
Excesso de bagagem só atrapalha sua viagem
Uma vez vencido o check-in, o passageiro já despachou sua bagagem, que supõe estar em segurança, sob os cuidados rigorosos da companhia aérea. Todavia, a bagagem vai cumprir uma verdadeira "via crucis" pelos tortuosos caminhos aeroportuários. 
De fato, mesmo uma boa mala raramente resiste mais de 10 viagens aéreas, pois vira lixo depois disso. Quanto ao seu conteúdo, nem se fala. Os passageiros experientes evitam colocar qualquer coisa mais importante, valiosa ou frágil na bagagem de porão. Muitos empregados no manuseio de bagagens ou cargas são terceirizados das companhias aéreas, e nem sempre são cuidadosos ou honestos nessa tarefa. Existem verdadeiras máfias de ladrões de bagagem em quase todos os grandes aeroportos.
Quanto ao voo, será que está garantido? A resposta é: NÃO. Os aviões dependem de condições meteorológicas favoráveis, infraestrutura do aeroporto e condições de tráfego aéreo para cumprir seus horários. Eventuais problemas de manutenção também podem atrasar ou cancelar voos.

Enquanto está no aeroporto, aguardando o seu voo, o passageiro tem à sua disposição uma infinidade de serviços de alimentação, lazer e compras. Mas uma surpresa desagradável o espera: os preços são verdadeiramente absurdos, e meio Kg de comida self-service no aeroporto pode sair mais caro que um bom rodízio de carnes nobres na melhor churrascaria da cidade.

A essa altura, o passageiro novato pode começar a sentir uma absurda saudade dos ônibus e dos terminais rodoviários. Mas, depois de entrar na sala de embarque e ser bisbilhotado pelos equipamentos de raio-x, parece que seus problemas acabaram.
Sem fingers, é necessário enfrentar chuva, vento e frio
É um engano. Na hora do embarque, as empresas dão prioridade aos passageiros com necessidades especiais, grávidas, pessoas com crianças de colo e menores desacompanhados. É justo. Mas existem outros passageiros "especiais", como celebridades, pseudocelebridades e políticos, que embarcam antes.

Muitos aeroportos não possuem pontes de embarque, os fingers. Se o tempo não estiver bom, o passageiro pode ter que caminhar debaixo da chuva e do vento até chegar à aeronave, ou enfrentar ônibus quase sem assentos para os passageiros. Dá saudades até das piores rodoviárias.
Uma vez no interior da aeronave, o passageiro novato novamente se espanta ao ver o espaço físico a ele destinado. Trens de subúrbio ou ônibus urbanos são mais espaçosos que a maioria dos aviões. O passageiro obeso ou muito alto sente vontade de descer ali mesmo. Mas isso não exclusividade do Brasil, no mundo inteiro é assim, ou ainda pior.
O voos domésticos são geralmente rápidos, o que reduz o extremo desconforto de uma poltrona que parece ter sido projetada para crianças de 1,40 m de altura e 35 Kg de peso. Mas o passageiro de um voo internacional sofre uma verdadeira tortura, ao voar de 6 a 16 horas em poltronas idênticas às dos aviões domésticos. É até de se espantar que consiga caminhar normalmente depois.
Poltronas de ônibus: muito mais confortáveis e espaçosas que as dos aviões
Ao desembarcar, o passageiro deve se sentir extremamente feliz se: desembarcou no aeroporto de destino, no horário previsto; conseguiu localizar e apanhar sua bagagem; encontrou um táxi para levá-lo para casa ou para o hotel.

Desembarcar no destino é uma verdadeira loteria. Condições meteorológicas desfavoráveis podem obrigar um avião a pousar em um aeroporto de alternativa. A companhia aérea deve providenciar transporte para o destino final e, se for o caso, arcar com despesas de alimentação e hospedagem. Mas isso não tira o desconforto do passageiro que voa por uma hora e passa três outras horas dentro de um ônibus velho, fretado às pressas, para chegar ao seu destino. Isso, sem contar atrasos provocados por passageiros que se acham "importantes" e que insistem em ser despachados de táxi para suas casa, ou que permanecem inabaláveis a bordo dos aviões, esperando o tempo melhorar, atrasando todo mundo.
O passageiro mais experiente se sente muito feliz ao avistar sua bagagem, aparentemente intacta, na esteira do desembarque. Verificar o estado do seu conteúdo em casa, depois já é outra história... Mas é difícil ficar um bom tempo esperando a bagagem aparecer, se ela insiste em não aparecer. Reclamar não adianta muito, pois o passageiro vai acabar indo para o hotel sem roupa para trocar e sem muitos ítens igualmente essenciais. Quando a bagagem aparecer, se aparecer, já será tarde para quem teve que fazer compras não programadas para manter um mínimo de conforto fora de casa.
Cadê a minha bagagem?
Ao chegar ao aeroporto de destino, uma das necessidades mais prementes do passageiro é conseguir um transporte para sua casa ou para o hotel. Nos aeroportos brasileiros, esqueça os meios de transporte essenciais e básicos nas grandes cidades, o metrô e o trem urbano. Simplesmente, não existem em nenhum aeroporto brasileiro.

Se um passageiro desembarcar do seu ônibus no Terminal da Barra Funda, em Sâo Paulo, por exemplo, pode optar em pegar o metrô, o trem, o ônibus ou o táxi para chegar ao seu destino. Se desembarcar do seu voo no Aeroporto de Congonhas, o mais movimentado do Brasil, terá que disputar um táxi a tapas, pois o trem e o metrô estão a quilômetros de distância, e os ônibus parecem latas de sardinha ambulantes. Esse passageiro, no entanto, pode se sentir muito feliz ao pegar o táxi, já que em alguns aeroportos, como o do Galeão, no Rio de Janeiro, ele corre o risco de pegar um táxi "pirata", que irá fazer uma "escala não programada" em alguma "boca de fumo", onde será sumariamente dilapidado dos seus bens.
Táxis nos aeroportos: problemas a vista
Eis alguns conselhos úteis para os passageiros menos experientes com os aviões:

  • Pesquise os preços das passagens antes de comprar e, se puder, compre com mais antecedência;
  • Chegue bem cedo ao aeroporto, antes do seu voo. As vítimas do overbooking são geralmente os retardatários;
  • Leve somente a bagagem indispensável. Não pague altas tarifas de excesso de bagagem para levar roupas e sapatos velhos;
  • Só leve consigo objetos de valor se for absolutamente necessário, e mantenha os mesmos na bagagem de mão;
  • Deixe em casa objetos como canivetes, facas de churrasco, ferramentas de manicure ou cabeleireleiros, tesouras e coisas semelhantes, pois seu destino final será, certamente, o lixo;
  • Utilize os serviços de proteção de bagagem como a plastificação das malas, por exemplo, pois isso dificulta o trabalhos dos ladrões de bagagem, que vão preferir alvos mais fáceis;
  • Cuide muito bem da bagagem de mão dentro dos aeroportos, para evitar furtos;
  • Use malas, mesmo as de mão, de cores vivas, como laranja, verde-limão ou amarelo. Aposente as malas pretas ou azuis. Será muito mais fácil visualizar uma mala colorida na esteira, e mesmo um ladrão audacioso evitará furtar uma mala de cor muito chamativa;
Malas coloridas: uma boa escolha
  •  Não use roupas caras ou de grife;
  • Distribua seu dinheiro, cartões e documentos em vários bolsos ou bolsas, não deixe tudo em um lugar só;
  • Se puder, evite fazer refeições no aeroporto, é muito caro;
  • Não discuta com pessoal do check-in sobre atrasos e cancelamentos de voos, eles não podem resolver seu problemas e nem são responsáveis por isso;
  • Empresas aéreas não são culpadas por condições meteorológicas desfavoráveis;
  • No desembarque, arranque todas as etiquetas de bagagem colocadas pelas empresas aéreas, pois chamam a atenção dos ladrões;
  • Não utilize táxis e transportes alternativos fora dos locais apropriados;
  • Se possível, peça a um amigo, parente, hotel ou agente de viagem para buscá-lo no aeroporto, pois é mais seguro;
  • Não use o avião para chegar a um evento inadiável, como entrevista de emprego ou concurso público, ou voe com suficiente antecedência;
  • Considere sempre meios de transporte alternativos, como os ônibus. Nem sempre viajar de avião é vantagem, mesmo pagando menos. Na Europa ou no Japão, o trem pode ser mais rápido que o avião.

3 comentários:

  1. É claro que nem só os passageiros estão sujeitos a problemas. Os tripulantes também sofrem na sua profissão, mas isso requer um artigo exclusivo, que logo será publicado. Quem já passou por problemas ao viajar, quer seja passageiro ou tripulante, peço que se manifestem.

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  2. Sempre segui as recomendações citadas pelo Professor. Mas, em 13/Nov/11, de nada adiantou chegar cedo em sbgr. Mesmo sabendo que havia uma passageira cadeirante no voo, a Infrazero posicionou o 737 na posição remota "B" Pátio #5, perto dos aviões abandonados, o lugar mais afastado do TPS 2. Haviam 6 solicitações do ambulift na nossa frente e apenas um veículo disponível. Aí ele quebrou. Após 01hs:20min, a Infrazero deu um "jeitinho" e embarcou de modo constrangedor a passageira. Depois, ficamos mais 25 minutos aguardando uma "janela" para podermos decolar. No fim das contas, cheguei em sbvt apenas 15 min. antes do ônibus que partiu da minha cidade, na mesma hora em que fui para o aeroporto. Agora que privatizou, deverá melhorar.

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  3. Sou piloto e professor de aviação em Londrina, vivo disso, mas sou obrigado a admitir que dou Graças a Deus pela existência dos ônibus executivos e leitos da Viação Garcia...

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