O Comissário de Voo é um dos tripulantes mais importantes a bordo de uma aeronave de passageiros. Longe de serem simples atendentes dos passageiros, eles são responsáveis pela segurança de todas as pessoas a bordo, inclusive dos demais tripulantes.
Desdenhados, às vezes, por alguns pilotos e passageiros como "garçons" ou "garçonetes" de avião, sua função vai muito além disso. Na verdade, comissários e comissárias de voo já salvaram dez vezes mais pessoas que o total de vitimas fatais da aviação desde o início de sua história, e raros foram os casos em que a atuação dos comissários foi realmente desastrosa.
Nos primeiros voos da aviação comercial, a bordo de dirigíveis, já existiam os hoje chamados "tripulantes de cabine", mas suas funções, nesse caso, eram mais especializadas. Os dirigíveis eram verdadeiros navios aéreos, e a composição da tripulação era muito mais parecida com a dos navios. Existiam garçons, camareiros, cozinheiros e comissários.
Quando os aviões começaram a prestar serviços comerciais, na década de 1920, o pequeno espaço disponível a bordo praticamente inviabilizava a manutenção de um tripulante de cabine. Os passageiros eram atendidos pelos pilotos, que entregavam um "serviço de bordo", muitas vezes reduzido a chicletes (para equilibrar a pressão interna dos ouvidos), enormes chumaços de algodão (para proteger o ouvido do ruído produzido pelos motores e sacos de indisposição, de papel encerado, e, depois, de plástico.
Algumas empresas contratavam atendentes, em geral adolescentes ou pessoas de baixa estatura, para acalmar passageiros nervosos, carregar bagagens e ajudar as pessoas a se acomodar. Eram sempre do sexo masculino. Tais tripulantes tinham pouco ou nenhum treinamento para isso e somente atendiam a bordo das maiores aeronaves. Não era raro que o copiloto acumulasse as duas funções. As empresas Daimler e Stout foram as pioneiras em contratar tais tripulantes, a partir de 1922.
Em 1930, um executivo da Boeing Air Transport (antecessora da United Airlines), Steve Simpson, de San Francisco, auxiliado por uma enfermeira, Ellen Church, propôs um novo tipo de atendimento. Ellen Church, natutal de Cresco, Iowa, então com 26 anos de idade, era enfermeira e piloto de aeronaves, mas logo percebeu que a empresa não iria contratá-la como piloto. Ao invés, conseguiu convencer Simpson da necessidade de uma enfermeira a bordo dos aviões, para ajudar os passageiros que passavam mal, algo relativamente comum até então. Os aviões da época não eram pressurizados, voavam baixo, em ar turbulento, e eram muito barulhentos. O nervosismo dos passageiros era outro problema sério.
Simpson gostou da idéia, já que a simples presença de uma enfermeira a bordo já serviria para acalmar passageiros mais nervosos. Contratou Ellen Church como chefe das comissárias de voo da empresa. Sete outras comissárias, todas enfermeiras, foram contratadas por um período inicial de experiência de três meses.
As primeiras oito comissárias de voo foram: Ellen Church, Margaret Arnott, Jessie Carter, Ellis Crawford, Harriet Fry, Alva Johnson, Inez Keller e Cornelia Peterman.
As primeiras oito comissárias de voo foram: Ellen Church, Margaret Arnott, Jessie Carter, Ellis Crawford, Harriet Fry, Alva Johnson, Inez Keller e Cornelia Peterman.
Rara foto colorida das oito comissárias pioneiras |
A Boeing Air Transport denominou essas comissárias de "Sky Girls" (meninas do céu). Os requisitos de contratação eram rigorosos: a candidata não deveria ter mais de 25 anos, devia ter menos de 5 pés e 4 polegadas de altura (aproximadamente 1,62 m) e menos de 115 libras de peso (aproximadamente 52 Kg). Embora tal requisito não estivesse escrito em nenhum lugar, a candidata deveria ser atraente, pelo menos aos olhos do responsável pela contratação, já que a Boeing planejava uma jogada de marketing ao introduzir comissárias nas suas tripulações, para atrair mais passageiros.
Nessa época, as comissárias deveriam se aposentar ao completar 31 anos de idade.
Comissária atendendo passageiros a bordo de um Boeing 80A |
A experiência foi bem sucedida, e outras empresas aéreas logo imitaram a iniciativa. Como contratar exclusivamente mulheres não era o ideal, especialmente em uma época ainda muito "machista", muitos homens também foram contratados, especialmente nas empresas européias, e pouco tempo depois deixou-se de exigir a qualificação de enfermagem para o exercício da profissão. A exigência de baixa estatura e baixo peso, no entanto, perdurou até que as empresas começassem a usar os jatos, no final da década de 1950.
O salário inicial das comissárias de voo era atraente, na época: 125 dólares por mês.
O primeiro voo das comissárias, com Ellen Church a bordo, ocorreu em 15 de maio de 1930, entre Oakland, Califórnia, a Chicago, Illinois, e durou 20 horas, com nada menos que 13 escalas.
Nessa época, pouco glamour cercava a profissão: as comissárias tinham que distribuir e recolher os saquinhos de indisposição, verificar eventualmente a pressão arterial dos passageiros, ajudar a reabastecer a aeronave, conferir os bilhetes de passagem, consertar assentos quebrados durante o voo e ajudar os pilotos a empurrar o avião para dentro do hangar, ao final da jornada.
Ellen Church trabalhou como comissária na Boeing durante apenas 18 meses. Um desastre de automóvel a afastou do voo e da Boeing. Voltou a trabalhar como enfermeira, mas seus dias na aviação ainda não tinham terminado. Durante a Segunda Guerra Mundial, serviu no Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos como enfermeira de voo, e foi condecorada com a Air Medal pelos serviços prestados durante o conflito, na Europa e no Norte da África.
Após a Guerra, estabeleceu-se como enfermeira em Terre Haute, Indiana. Em 1964, aos 60 anos de idade, casou-se com Leonard Briggs Marshall, Presidente do Terre Haute First National Bank. Infelizmente, um ano depois, em 22 de agosto de 1965, exatamente um mês antes de completar 61 anos, faleceu ao cair de um cavalo.
Aeroporto Ellen Church, em Cresco, Iowa |
No Brasil, as companhias aéreas somente passaram a contratar comissários após a Segunda Guerra Mundial, embora se saiba que algumas empresas chegaram a fazer experiências com esses tripulantes ainda durante as décadas de 1930 e 1940.
As empresas pioneiras na contratação de comissários foram a Varig, a Real e o Lóide Aéreo. A Varig só contratava homens, mas a Real e o Lóide empregavam muitas mulheres na função. A Varig somente começou a contratar mulheres quando estava para iniciar os voos internacionais para Nova York, em 1954. Os aviões empregados na rota, os Lockheed Super Constellation, tinham leitos para os passageiros, e não era conveniente que comissários do sexo masculino atendessem mulheres e crianças nesses leitos. Posteriormente, as mulheres passaram a predominar na profissão.
Uma dessas pioneira comissárias da Varig, Alice Editha Klausz, era bibliotecária até que que a Varig anunciou que contrataria comissárias, em 1954, para atender a linha de Nova York. Como era uma linha internacional, a empresa exigia que a candidata dominasse pelo menos dois idiomas, coisa raríssima na época. Depois de aprovada em rigorosas provas, Alice passou a voar na Varig, e foi ela quem escreveu todos os manuais usados pelos comissários da Varig, tarefa que lhe foi incumbida pessoalmente pelo presidente da Varig, Ruben Berta, que colocou à sua disposição um escritório completo e várias datilógrafas.
Alice se aposentou da Varig aos 35 anos de serviço, em 1989, mas sua carreira como comissária de voo estava longe de terminar. Ela se candidatou à função no Proantar - Programa Antártico Brasileiro, por sugestão de um amigo.
Alice foi aprovada, e passou a atuar como comissária de voo nos Lockheed C-130 Hércules da Força Aérea Brasileira, que fazem os voos para o continente gelado. Embora já tenha passado dos 80 anos de idade, e se considere uma legítima "aerovelha", continua na função, sendo a comissária há mais tempo na função, no Brasil, e quem sabe do mundo inteiro. Também é a tripulante civil mais idosa do Brasil.
Hercules C-130 da FAB na Antártica: uma comissária a bordo |
Comissárias da Brannif nos anos 60. Até hoje, as mulheres predominam na profissão |
Poxa, essa história da tia Alice eu não conhecia.
ResponderExcluirVida longa a Tia Alice!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSerá que a "Tia Alice" ainda está na ativa?
ResponderExcluirfaleceu semana passada...
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ResponderExcluirSE A "TIA ALICE" ESTÁ NA ATIVA OU NÃO, LEMBREM-SE CARINHOSAMENTE: ESTAVA NA SUA ALMA, SERVIR, E SER ÚTIL AO SEMELHANTE - FAZER DA SUA PROFISSÃO, UMA APÓSTOLA DE SUA MISSÃO, NO RÁPIDO TRÂNSITO PELA TERRA!- MAIS UM PASSO NA ESCALA DA VIDA, PARA UM NOVO PATAMAR!-PARABÉNS, ALICE.
Louvável a força dessa senhora ! Viva tia ALICE !!
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