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domingo, 23 de maio de 2010

O perigo das cinzas vulcânicas para a aviação

No dia 15 de dezembro de 1989, o voo KLM 867, operado por um novíssimo Boeing 747-406M, o PH-BFC, decolou de Amsterdam com destino ao Aeroporto de Narita, no Japão, transportando 231 passageiros e 14 tripulantes. Quando sobrevoava o Monte Redoubt, no Alaska, que havia entrado em erupção apenas um dia antes, entrou em uma enorme nuvem de cinzas vulcânicas. As cinzas provocaram a parada completa de todos os quatro motores, e o 747 da KLM tornou-se, então, um enorme planador.
Ao serem ingeridas, as cinzas derreteram-se nas cãmaras de combustão e recobriram, com uma espécie de vidro, diversos sensores de pressão e temperatura, enganando o sistema eletrônico de combustível dos motores, o que resultou no corte automático do combustível. Por algum tempo, o avião ficou na dependência completa do sistema Stand-By Power, que é alimentado apenas pelas duas baterias da aeronave.

A tripulação viu a nuvem de cinzas do Redoubt (foto acima) à sua frente, embora a mesma não pudesse ser detectada pelo radar. Informou o Controle de Tráfego Aéreo que a mesma era apenas um pouco mais cinzenta que uma nuvem normal. O comandante decidiu atravessá-la, mas depois reportou fumaça na cabine, e solicitou desvio para a esquerda, subindo para 39 mil pés. Foi autorizado, mas logo a seguir reportou a falha completa dos motores.
Após descer mais de 14 mil pés, a tripulação conseguiu religar os motores, e finalmente o avião pousou em segurança em Anchorage, Alaska. Não houve feridos ou mortos a bordo, mas o custo de reparo da aeronave chegou a exorbitantes 80 mil hões de dólares americanos, incluindo a substituição de todos os motores, que tiveram perda total (foto abaixo).
Esse notável incidente não foi o único. Em 1982, outro Boeing 747, que cumpria o voo BA 009, da British Airways, também penetrou em uma nuvem vulcânica do monte Galunggung, na Indonésia, e seus quatro motores pararam também. Assim como aconteceu com o 747 da KLM, os pilotos também conseguiram reacender os motores e pousar em segurança em Jakarta. Dezenas de outros casos menos graves já foram relatados.
O risco das cinzas vulcãnicas para a aviação ficou muito evidente quando, em abril de 2010, o vulcão Eyjafjallajökull expeliu uma nuvem de cinzas (foto acima, vista do espaço) que provocou a interdição completa do tráfego aéreo sobre a maioria dos países europeus entre 14 e 23 de abril. Essa medida foi inédita, e afetou o tráfego aéreo mundial mais do que os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 sobre os Estados Unidos.
Entre os dias 14 e 21 de abril de 2010, cerca de 95 mil voos já tinham sido cancelados. No mapa abaixo, pode-se ver em vermelho os países que tiveram seu tráfego totalmente interrompido, em laranja os países que tiveram o tráfego interrompido parcialmente ou eventualmente, e em verde a Islândia.
O Eyjafjallajökull, que fica sob uma geleira, tinha entrado em erupção no dia 20 de março de 2010, mas sua atividade era fraca. A partir de 14 de abril, começou a emitir uma gigantesca nuvem de cinzas, que foi levada pelos ventos para a Europa Ocidental e alcançou áreas tão distantes entre si como Labrador, no Canadá, e o Casaquistão, na Ásia Central (mapa abaixo).
Depois de 23 de abril, o tráfego foi sendo progressivamente reaberto, sendo interrompido algumas vezes depois desse dia, especialmente sobre a Espanha e Portugal.

Uma das preocupações dos especialistas em vulcanologia é que o Eyjafjallajökull "acorde" o vizinho e muito mais poderoso vulcão Katla, como já aconteceu em outras ocasiões. Por volta de 20 de maio, entrentanto, esse risco já era considerado pequeno.

Alguns aviões militares e até alguns civis chegaram a fazer voos de teste sobre a Europa para avaliar os riscos da nuvem de cinzas, e uma aeronave Boeing FA-18 da Força Aérea da Finlândia teve seus motores danificados parcialmente por resíduos vítreos acumulados nas câmaras de combustão e turbinas. Também foram encontrados resíduos em motores de outros três FA-18 que participaram da mesma missão, que ocorreu em 15 de abril. Um Lockheed-Martin F-16 da OTAN também teve seu motor parcialmente danificado por cinza derretida na seção quente do mesmo, no dia 16 de abril.
Infelizmente para a aviação, erupções vulcânicas e nuvens de cinzas são eventos extremamente comuns. O caso do vulcão Eyjafjallajökull foi realmente dramático, mas eventos menores acontecem com frequência várias vezes ao ano no mundo inteiro. Muitos vulcões ativos ficam em rotas muito voadas, como é o caso do Monte Soufrière, na Ilha de Montserrat, no Caribe, que fica bem na rota entre o Brasil e a Costa Leste dos Estados Unidos, e que entrou em erupção em 1995.

Na América do Sul, existem muitos vulcões na Argentina e, especialmente, no Chile, mas existem vulcões ativos em toda a região dos Andes. Um serviço permanente de alerta contra nuvens de cinzas atualmente é prestado para proteger a aviação desse risco. No mundo inteiro, existem nove centros de aviso que monitoram cinzas baseadas em informações de terra, relatórios de pilotos e satélites.

Nuvens de cinza vulcãnica ocorrem geralmente em erupções explosivas, que lançam plumas que podem alcançar até 55 Km de altitude. A cinza vulcânica mais grosseira e os piroclastos (pedras lançadas do vulcão) se precipitam rapidamente, a não ser na presença de correntes ascendentes muito fortes, mas a cinza mais fina e leve pode ser levada até acima da tropopausa, e pode causar até mudanças climáticas. A erupção do Monte Pinatubo, nas Filipinas, em 1991, lançou mais cinzas na atmosfera que todas as erupções desde a do Krakatoa, em 1883, e alterou a temperatura global em menos 0,5º C, causando severo impacto no clima no mundo inteiro por meses (foto abaixo).
As cinzas do Pinatubo se espalharam em uma larga região ao redor do mundo, e pelo menos onze aeronaves declararam emergência devido às cinzas, sendo que três dessas tiveram seus motores destruídos. O McDonnell-Douglas DC-10 abaixo foi surpreendido no solo por uma "chuva" de cinzas após pousar na Estação Aeronaval Americana de Cubi Point, nas Filipinas, tendo seu centro de gravidade deslocado pelas cinzas acumuladas, o que fez sua cauda bater no chão.
Nuvens de cinza não podem ser detectadas pelo radar meteorológico, mas, como produzem atividade elétrica muito intensa (foto abaixo, no Chile), podem eventualmente ser vistas mesmo à noite, ou detectadas por dispositivos detectores de atividade elétrica.

8 comentários:

  1. Prof. Se já imaginou se 02 ou até 03 vulcões com essa força, entassem em erupção juntos!!!!Tava fud...!!!!

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  2. Ontem, 17 de junho de 2010, o vulcão Tungurahua, situado no Equador, entrou em erupção, lançando um fluxo piroclástico e cinzas que provocaram o fechamento do Aeroporto de Guayaquil. O Tungurahua, de 5020 metros de elevação, está em atividade constante desde 1999.

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  3. pois so que ontem nao foi 17 de junho 2010..afinal a quantos andamos?.....

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  4. Em 72 vi no filme Elvis Triunfal um Gulfstream, a partir de então tornei-me um entusiasta e apaixonado pela aviação. Em 74 fui trabalhar na Varig em contato com aviões, la vi a chegada dos 737 advancer e DC-10, mas em 76 fiquei encantado qdo. vi as fotos do interior de um Boeing 727-100 vip, não sabia que um avião podia ter aquela configuração. A partir de então comecei a ler e aprender sobre aviação, mas as inf. só em revistas e jornais especializados, hoje com a internet não há mais limitações para aprendermos principalmente com uma equipe séria, inteligente e que conhece a fundo o mundo da aviação, parabens. Neto - RJ

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  5. O fenómeno do Fogo se S. Elmo tem a ver com a actividade electrica nas cinzas?

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  6. Blacksmith, o fenômeno do Fogo de Santelmo é relacionado com qualquer eletricidade atmosférica, e indica a presença de um "líder", o caminho por onde depois passará um raio. Como as nuvens de cinzas têm atividade elétrica muito maior que do que as nuvens CB comuns, sem dúvida ocorrerão Fogos de Santelmo nas nuvens de cinzas, com mais intensidade do que nos CBs.

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