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domingo, 5 de dezembro de 2010

Telefone celular em aeronaves: por que é proibido?

Na última década, o mundo assistiu a um assombroso crescimento do uso da telefonia celular, e em alguns países, o número de aparelhos superou o número de habitantes. Mesmo no Brasil, isso já está bem perto de acontecer.
 Naturalmente, o usuário de um aparelho celular aprecia a comodidade de poder se comunicar em praticamente qualquer lugar ou mesmo em deslocamento. Claro que as regras da boa educação devem ser obedecidas, e o usuário não deve usar, ou mesmo deixar ligado o aparelho, durante cultos religiosos, cerimônias, palestras ou aulas.

Uma restrição de uso do aparelho, entretanto, costuma irritar os usuários: a proibição de se falar ao celular a bordo de aeronaves em voo. Em geral, o passageiro de uma aeronave comercial necessita ou deseja se comunicar com alguém durante o voo, como pessoas que o esperam no aeroporto, casa ou empresa, locadoras de veículos, hotéis ou restaurantes.

Em geral, a proibição do uso do celular a bordo irrita as pessoas, especialmente porque elas não tem a menor idéia do motivo que leva à essa proibição.

Pela atual legislação brasileira, o uso do telefone celular é proibido em todas as fases do voo e também no pátio do aeroporto, no trajeto entre as salas de embarque/desembarque e a aeronave, sendo todavia permitido a bordo do avião quando o mesmo está no solo, com as portas abertas e os motores desligados.
Para se entender a proibição do uso do celular a bordo, é preciso entender primeiro o que é um telefone celular. Ele nada mais é do que um sofisticado aparelho de rádio, que recebe e transmite ondas eletromagnéticas de e para antenas no solo, cada uma delas capaz de receber e retransmitir sinais, com alcance limitado a uma determinada área, denominada célula, daí o nome de telefone celular (em Portugal, chama-se telemóvel).

As ondas eletromagnéticas recebidas e transmitidas pelos aparelhos estão em diversas faixas de frequência, na banda denominada UHF (Ultra High Frequency - Frequências Ultra Altas), mais precisamente nas frequências de 415 MHz, 900 MHz e 1,8 GHz, com pequenas variaçãoes entre as diversas regiões do mundo, isso para o sistema digital.

Mesmo em modo de espera (stand-by), os aparelhos se comunicam  frequentemente  e automaticamente com as antenas de terra, para manter o contato com a rede. A potência de transmissão do aparelho varia automaticamente com a distância entre o telefone celular e a antena de terra. Pode variar entre 20 miliwatts até 3 watts. Quanto mais distante a antena, mais potência é requerida para que a comunicação seja estabelecida e mantida.
 
Isso pode ser facilmente percebido por qualquer usuário de telefone celular. Quando o mesmo é utilizado dentro da área urbana, próximo das antenas, a bateria dura muito mais tempo, pois uma potência muito baixa é exigida para estabelecer a comunicação com uma antena. Mas quando o celular é utilizado em uma viagem, por exemplo, a bateria esgota sua carga rapidamente, pois o aparelho tem que transmitir com maior potência para estabelecer contato com uma antena mais distante.

A possibilidade de uma onda eletromagnética transmitida por um celular interferir em algum sistema do avião é tanto maior quanto maior for a potência do sinal, e aí é que pode ocorrer algum problema, pois um avião em voo quase sempre estará muito distante das antenas. Na maior parte das vezes, na verdade, estará fora do alcance das mesmas. Mesmo assim, um aparelho em stand-by emitirá sinais continuamente, na máxima potência possível, tentando encontrar uma antena, pois foi projetado para isso.

Outra questão importante refere-se ás frequências utilizadas pelos sistemas de telefonia celular e a transmissão de dados, tanto por ondas eletromagnéticas tanto por cabos, dentro de uma aeronave ou entre a aeronave e o solo. Obviamente, a faixa de frequências utilizada nos celulares não é a mesma utilizada para transmitir dados entre os computadores do avião ou para os seus sistemas de navegação.

Teoricamente, não deveria haver interferência, pois os sinais são transmitidos em frequências precisas e devidamente autorizadas e certificadas. Na prática, porém, as coisas são muito diferentes, devido à existências das ondas harmônicas. Uma onda harmônica é gerada em frequências que são múltiplos inteiros da frequência fundamental. Ou seja, um aparelho que transmita uma onda eletromagnética de 20 KHz também vai transmitir ondas harmônicas de 40 KHz, 60 KHz, e assim por diante, embora mais fracas que a onda da frequência fundamental.

Eventualmente, a frequência de uma dessas ondas harmônicas pode coincidir com um sinal de rádio comunicação ou rádio-navegação do avião, causando interferência ou fading do sinal, tendo o resultado prático de perturbar a comunicação ou causar erros na navegação, o que pode ter um efeito potenciamente desastroso.

A interferência não está restrita às ondas eletromagnéticas que viajam pelo ar. Um cabo lógico utilizado para comunicação entre diversos sistemas da aeronave pode funcionar como uma antena, captando uma onda eletromagnética de um celular ou suas harmônicas,  interferindo na informação conduzida por esse cabo.
Se pensarmos que grande parte das aeronaves atualmente fabricadas possuem comandos de voo primários operados por computador e cabos lógicos, fica evidente a extensão dos problemas que um aparentemente inocente celular pode, potencialmente, causar em um avião.

É claro que o engenheiro aeronáutico pensou nisso, ao projetar os sistemas eletrônicos de uma aeronave. Pode-se isolar um cabo lógico através de uma blindagem, devidamente aterrada, que consiste na prática em encapar os fios com uma malha metálica ou embutí-los em um tubo  metálico. Mas isso não exclui totalmente a possibilidade de interferência. Para comprovar isso, basta fazer uma experiência muito simples: liguem as caixas de som de um computador doméstico, coloquem um arquivo *.mp3, por exemplo, para tocar, e coloquem um aparelho celular ao lado do computador. Liguem para o celular e vejam o que acontece.

Os cabos de computador também possuem blindagem, como os cabos usados em aeronaves. Mas haverá interferência na reprodução do som, na forma de um ruído irritante, em grande parte dos casos.

Então, existe a possibilidade, não tão remota, de um aparelho celular interferir não somente nos sinais de rádio comunicação e navegação transmitidos ou recebidos pelas aeronaves, mas também nas informações transmitidas por cabeamento entre os diversos sistemas do avião. Nas aeronaves com comandos fly-by-wire, hoje muito comuns, não se pode descartar inclusive a possibilidade de interferência direta nos comandos de voo por um telefone celular.

Em testes conduzidos pelos fabricantes de aeronaves e de aviônicos, já se verificou diversos problemas, como desconexão acidental do piloto automático, congelamento da bússola ou diferença considerável na indicação da proa magnética, erros de até 5 graus na indicação do curso em equipamento de VOR, instabilidade do CDI tanto no modo VOR quanto no modo ILS (com e sem indicação da bandeira de inoperabilidade), indicação invertida da bandeira TO-FROM (eliminador de ambiguidade), redução da sensibilidade do Localizador do ILS e ruído de fundo nas comunicações por rádio ou intercomunicador interno. Os problemas acima foram detectados e comprovados pela Boeing, utilizando-se um celular operando em potência máxima a 30 cm do aparelho em teste.

Testes em condição de voo ou situações mais realistas são difíceis de conduzir, pois é difícil que um aparelho emita as mesmas ondas harmônicas em todas as situações. Ademais, nos testes em terra, geralmente existem antenas de celular próximas, fazendo o aparelho transmitir em potência muito baixa e com baixo risco de interferência.

Até hoje, não se conhece nenhum acidente que, comprovadamente, tenha sido causado por interferência eletrônica de aparelhos celulares, embora haja um bastante suspeito: em 11 de dezembro de 1998, um Airbus A310, operando o voo 261 da Thai Airways, da Tailândia, caiu quando tentava pousar, pela terceira vez, no aeroporto de Surat Thani, Bangkok. A grande quantidade de aparelhos celulares encontrados nos destroços, muitos ainda ligados, levaram à suspeita de que os aparelhos estivessem sendo usados pelos passageiros para avisar seus familiares que o voo estava atrasado.

Os fabricantes de aeronaves e de sistemas eletrônicos estão, obviamente, atentos a essa vulnerabilidade dos sistemas à interferência eletrônica. Diariamente, técnicos e engenheiros testam os sistemas com todos os tipos possíveis de aparelhos celulares, para excluir qualquer possibilidade de interferência. Em alguns países e algumas empresas, já foi possível liberar total ou parcialmente o uso de celular, depois de se descartar qualquer possibilidade de interferência em testes exaustivos.

No Brasil, a TAM já liberou o uso do celular em alguns voos. Para evitar a frustração do passageiro, cujo celular não vai conseguir achar uma antena de solo na maior parte do voo, a TAM equipou uma aeronave Airbus A321 com uma antena retransmissora, o que o torna, na prática, uma "célula". Essa antena, por sua vez, se comunica com a rede de satélites Inmarsat SwiftBroadband, que por sua vez a retransmite para a rede de celulares em terra. O sistema permite que até 8 passageiros falem ao celular ao mesmo tempo. Também estão disponíveis serviços de Internet pela rede GPRS ou enviar mensagens SMS, sem limitação de uso simultâneo de aparelhos.
Os celulares operarão em regime de Roaming internacional, e a tarifa será cobrada pela operadora de celular do usuário de acordo com as suas tabelas normais. O serviço foi certificado pela ANAC e pela ANATEL, e não interfere em sistemas do avião, pois como a antena está localizada na própria aeronave, os celulares transmitem em potência baixa  demais para causar problemas.
Futuramente, após o período de experiência com esse único A321, outras aeronaves da TAM deverão ser equipadas com o sistema. É de se esperar que outras empresas sigam o exemplo e passem a equipar suas aeronaves com sistemas semelhantes.

Enquanto o sistema de telefonia celular não é liberado nos aviões, o que poderá ocorrer em breve, o passageiro deve se abster do seu uso durante o voo. Caso desobedeça à proibição, poderá, a critério do comandante da aeronave, ser denunciado às autoridades aeronáuticas e civis, podendo ser inclusive acusado de afetar a segurança de voo e ser desembarcado compulsoriamente na primeira escala, sem prejuízo das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis.

5 comentários:

  1. Grande Jonas

    Realmente muito esclarecedor. Não sabia que a alta potencia da transmissão do celular poderia afetar os cabos lógicos!!

    Abraço

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  2. Prezados,
    Vcs sabem o por que que a TAM não autoriza o uso de celular em voo mesmo em modo avião, quando teoricamente o aparelho está com a antena desligada? Isto já aconteceu quando voava de A319, A320, A330 e no B773.
    Abraços
    Tibúrcio Barros

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  3. Tibúrcio, as empresas não autorizam porque a tripulação não consegue fiscalizar cada aparelho individualmente para confirmar se o aparelho está mesmo em modo inflight, e vc sabe que existe muito espertinho que poderia usar esse subterfúgio para burlar a proibição.

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  4. Parabéns!!!

    Texto muito esclarecedor.

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  5. queria que fosse proibido nos ônibus de viagem também... tem gente que não conversa no celular... grita!!!

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